quarta-feira, março 29, 2006

Fadas e duendes


Ficava mesmo em frente à casa, no fim da alameda que descia pelo jardim. Era uma floresta imensa, uma nave feita de cheiro a seiva, ninhos, caruma e espinheiros, o voo furtivo de alguma ave, borboletas, lagartixas. Uma rede de caminhos que íamos marcando dia a dia, num labirinto de direcções que só faziam sentido na geografia da imaginação, o caminho de baixo, o da pedra grande, o da clareira, o da cabana, o do pinheiro velho. Os mais suaves e os outros, que nos arranhavam as pernas, talvez os mais apetecidos. De chapéu largo e calções, sentados no regaço da sombra, desembrulhávamos os mantimentos trazidos para a travessia, pão com marmelada, figos e chocolate, e preparávamo-nos para enfrentar estoicamente as formigas e a caruma que nos picava as costas.
No ar nadava o cantar das rolas e o sussurro dos duendes, sempre furtivos e bisbilhoteiros. “Talvez um dia apareça uma fada”, pensávamos, e fazíamos muita força com o coração, de olhos bem fechados.

Era um mundo sempre em mudança, sempre diferente conforme entrássemos pelo canto do muro velho, pela horta vizinha, ou pelo campo de jogos. Uma floresta imensa, digo-vos. Tinha para cima de cinquenta pinheiros e dois ou três eucaliptos antigos, para não falar das duas famílias de duendes que a habitavam há várias gerações. Só fadas é que nunca conseguimos ver, por mais que fechássemos bem os olhos e fizéssemos força com o coração.
Tempo – tanto tempo…- depois passei por lá. Onde antes havia verde está agora o grupo columbófilo, casas, e mais acima uma escola. Cortaram as árvores, dizem-me. Eu cá não acredito. Não é fácil acabar com uma imensa floresta, é demasiadamente sábia. Nem arrasar com as casas dos duendes, desses nem vale a pena falar. Por mim acho que a floresta largou amarras e anda aí a navegar pelo céu à procura do país das florestas, manobrada pelas famílias de duendes.

E mais.
Vi a fada, e nem foi preciso fazer força com o coração nem fechar os olhos. Numa enorme parede, bem no centro da escola, lá estava ela, tal como a imaginava. Varinha mágica entre as mãos transparentes, o vestido de todas as cores, o sorriso mágico debaixo do véu, o rastro de estrelas. Olhava para o céu, tenho a certeza que sabia por onde andava a floresta, só passou por ali para deixar aos meninos pão com marmelada, figos e chocolate.

3 Comments:

Blogger Elsa Gonçalves said...

Imaginação é a capacidade de fantasiar a partir de dentro. Tens essa aptidão para construir reais com fadas, duendes e tudo o mais que te apetecer. E sabes...uma fada acabou de me deixar aqui um pãozinho com marmelada... agorinha mesmo, disse que vinha dos algarves...e não disse mais nada. Deixou pendurada na minha janela uma fadinha de verdade ... verde e pequenina, que parece que veio de uma ratakatu qualquer.
Beijos abraços e muitos palhaços.
maria

10:32 da tarde  
Blogger poca said...

fairy season...

1:18 da manhã  
Blogger Seamoon said...

eU ACREDITO em fadas,duendes,anjos...essas coisa todas boas ....á coisas que teimo em nunca mudar,esta é uma delas.
bjs
adorei o post

3:21 da tarde  

Enviar um comentário

<< Home